Terrorismo Judeu

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Enterro do bebê morto em Duma (The Guardian)

Neto de um rabino assassinado que inspirou a militância religiosa e de extrema-direita em Israel, Meir Ettinger foi preso pelo serviço secreto interno israelense três dias depois do incêndio que matou um bebê palestino de 18 meses e feriu seu pai e irmão de quatro anos com graves queimaduras, na aldeia de Duma, na Cisjordânia, provocado por um coquetel molotov lançado, ao que tudo indica, por um grupo terrorista judeu.

Banido da Cisjordânia e proibido de entrar em Jerusalém, Ettinger, 18 anos, estava morando na

Meir Ettinger, o primeiro suspeito preso. (AFP PHOTO / JACK GUEZ)

Meir Ettinger, o primeiro suspeito preso. (AFP PHOTO / JACK GUEZ)

cidade cabalística de Safed, ao Norte de Israel. Ao ser preso, acusou o Shin Bet, o serviço secreto, de usá-lo para “relações públicas”, mostrando alguma ação depois que o atentado em Duma, perto de Nablus, repercutiu mundialmente e em Israel.

“A verdade tem que ser dita” — e ele a escreveu como se fosse universal, não a de uma minoria: “Não há organização terrorista em Israel, mas um grande grupo de judeus, mais do que se imagina, cujos valores são completamente diferentes dos da Suprema Corte de Justiça e do Shin Bet. Não somos guiados pelas leis de Estado, mas por leis eternas, as verdadeiras leis”.

O Shin Bet não acusou Ettinger, formalmente, pelo atentado. A prisão é atribuída a um cerco

Aviator Slonim (Tomer Appelbaum/Haaretz)

Aviator Slonim (Tomer Appelbaum/Haaretz)

geral a grupos radicais e religiosos. Ele seria o chefe de uma célula de terror que tem atacado muçulmanos e cristãos, conhecida por Price-Tag, o preço da Israel que idealizam. Outros dois judeus suspeitos foram presos, Mordechai Mayer, 18, e Aviator Slonim, ambos com detenções precedentes, a última das quais pelo incêndio da igreja da Multiplicação dos Pães, em Tabghana, na Galiléia, em junho.

Rabino Meir Kahane

Rabino Meir Kahane

Bandeira do Kach: punho dentro da estrela de David

Bandeira do Kach: punho dentro da estrela de David

O avô Kahane lutou para deportar todos os árabes de Israel — e, para ele, o país era ainda maior, a bíblica Judea e Samaria, sem as fronteiras da Cisjordânia. Quando correspondente acompanhei a Marcha da Vitória que ele promoveu ao ser eleito membro do Parlamento, para grande surpresa e tristeza da maioria dos eleitores israelenses. A eleição de um racista, no povo dizimado pelo racismo, provocou mudança na legislação eleitoral, para evitar outros candidatos com plataformas antiárabes.

Os primeiros terroristas religiosos judeus foram os autoplocamados Zelotes, no primeiro século, rebelados contra o império Romano. Muitos os sucederam até os atentados contra ingleses e palestinos ao tempo do Mandato Britânico. Forças secretas lutaram pela criação do estado de Israel. Um de seus grandes atentados explodiu o hotel King David, em Jerusalém.

Rabino Moshe Levinger na celebração da criação da colônia Kiriat Arba pelo Gush Emunim  (EPA/JIM HOLLANDER)

Rabino Moshe Levinger na celebração da criação da colônia Kiriat Arba pelo Gush Emunim (EPA/JIM HOLLANDER)

O movimento Gush Emunim, ou Bloco da Fé, entre 1979-84, tinha planos de explodir as mesquitas na Esplanada do Templo, acima do Muro das Lamentações. Desistiu, mas levou adiante atentados a bombas contra vários prefeitos da Cisjordânia, entre eles Bassam Shakaa, de Nablus, que perdeu os braços e as pernas. O grupo Terror contra Terror, TNT na sigla em hebraico, foi formado para represálias a atentados palestinos.

Baruch Goldstein: 29 mortos na mesquita.

Baruch Goldstein: 29 mortos na mesquita.

Um americano-israelense, Yaakov Teitel, atentou contra um intelectual de esquerda em Israel, Zeev Sternhell, e matou um taxista e um pastor palestinos, em 1997. Outro americano religioso vivendo numa colônia da Cisjordânia, Baruch Goldstein, foi morto por sobreviventes entre 125 feridos depois de matar 29 muçulmanos que rezavam na Mesquita Ibrahimi, na Caverna dos Patriarcas, em Hebron. Ele pertencia ao Kach, do rabino Kahane, posto fora da lei ao elogiar o atentado.

O primeiro-ministro Yitzhak Rabin foi assassinado em 4 de novembro de 1995, enquanto cantava no encerramento de uma manifestação pela paz, na praça dos Reis de Israel, em Tel-Aviv, por duas balas disparadas pelo israelense Yigal Amir, que alegou ter seguido “ordens de Deus”.

Yigal Amir, assassino de Yitzhak Rabin (foto Jerusalem Post)

Yigal Amir, assassino de Yitzhak Rabin (foto Jerusalem Post)

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Jerusalém, 27/07/1984 — Que o chamem de “louco”, ele tolera. Mas de “extremista”? Aí não! O rabino Meir Kahane não concorda.

— Vamos enlouquecer este país… Vamos fazer este país ser de novo judeu – ele prometia em sua “marcha da vitória” pelas ruas de Jerusalém, ao confirmar-se a sua surpreendente eleição para o parlamento de Israel.

Louco, sim, mas não extremista. Qual a diferença? “Eu não tento dizer que não sou louco”, explicou-se o rabino Kahane ao correspondente da revista Time em Jerusalém. Mas a distinção não ficou clara. Então supõe-se a mesma diferença que ele próprio estabeleceu entre judaísmo e democracia:

— Se tiver que escolher entre judaísmo e democracia, claro que escolherei ser judeu.

A loucura que o rabino Kahane admite ter relaciona-se mais à religião do que à politica. Louco como ele seria, talvez, aiatolá Khomeini. Extremista, o coronel Muammar Kadafi.

As últimas eleições de Israel produziram este controvertido rabino Kahane, 51 anos, nascido no Brooklyn, em Nova York, além de um grande impasse político ainda não resolvido. Todos já procuraram dissociar-se dele: o ex-primeiro ministro Menachem Beguin, os candidatos rivais à formação de um novo governo, Shimon Peres e Yitzhak Shamir, os partidos políticos, os grupos de colonização na Cisjordânia, até o Departamento de Estado americano, que está querendo cassar a sua cidadania. Mesmo os terroristas judeus presos divulgaram um manifesto reagindo a sua promessa de anistiá-los: “Deixe-nos em paz”.

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Rabino Kahane (foto shameproject.com)

Mas 22 mil pessoas votaram no rabino Kahane. E agora ele vai assumir uma cadeira no parlamento, que ele quer transformar numa grande sinagoga, um de seus projetos. O parlamento deverá ser como ao tempo de Ezra e Nehemiah, 2500 anos atrás, uma “grande assembleia” — ou, em hebraico, “Knesset Há-gedolah”.

Loucura? Isto é só o princípio, se comparado com o objetivo fixado pelo rabino Kahane quando imigrou para Israel, em 1971. Ele quer deportar dois milhões de árabes – os 700 mil com cidadania israelense e os 1.3 milhão que vivem na Cisjordânia e Gaza.

Numa das vinte vezes que já esteve preso por incitamento ou distúrbios anti-árabes, o rabino Kahane escreveu um manifesto a que deu este título: “Eles precisam ir”. Eles quem? Os árabes. A teoria é a de que “sionismo, democracia e explosão demográfica da população árabe não podem coexistir em Israel.”

Aqui, outra vez, a distinção: “Israel é um estado religioso, e não político”. E seus demônios seriam a democracia e a demografia.

— Israel tem um encontro marcado com o suicídio nacional. E os seus lideres estão cegos – prega o rabino Kahane, ordenado pela Yeshivá Mir, em 1956. A única solução que ele vê é a de que “eles precisam ir embora”. E se não forem, terão que aceitar o status de não cidadãos, jurando lealdade ao estado judeu e reconhecendo a sua soberania.

A quem preferir partir, o rabino Kahane dará uma compensação pela propriedade abandonada, e uma gratificação. Ele acha que reuniria os primeiros 25 mil árabes se publicasse um aníncio pelos jornais. A quem ficar, e recusar lealdade, a solução é drástica: será posto num caminhão, e deixado na fronteira de um pais árabe.

O rabino Kahane ridiculariza quem equaciona a sua deportação de árabes com o genocídio de judeus por Hitler. E citando a bíblia: “Não há espaço para uma Segunda nação em Israel. Os árabes têm que partir. Não há escolha: são eles ou os judeus. E não serão os judeus”.

Loucura, mas não extremismo? Há quem diga que Israel não será mais o mesmo depois de eleito Kahane. E há quem prometa partir do país agora – os próprios judeus, não os árabes. O “fenômeno Kahane” foi condenado, lamentado e até mesmo ameaçado. Um dos principais jornais independentes do pais, o Haaretz, lembra que a corte suprema de justiça permitiu que o movimento “Kach”, do Rabino Kahane, entrasse na campanha eleitoral, depois que sua inscrição fora recusada. “Mas mesmo que a justiça tenha errado em seu julgamento, a democracia israelense não pode ficar indefesa contra às maquinações de Kahane”. Uma das ideias seria a de promulgar uma lei antirracista, inexistente num paÍs vítima do racismo, como Israel. Quem a pede é o prefeito de Jerusalém, Teddy Kollek, do Partido Trabalhista. A deputada Shulamit Aloni quer que se retire o status de rabino do “profano Kahane”.

Mas o rabino Kahane representa 22 mil eleitores – a maioria oriunda de países islamitas, segundo as estatísticas publicadas na primeira página do Jerusalem Post — na última, num editorial, “racismo na Knesseth”, Kahane é definido como “político patológico”, e suas últimas declarações, “repugnantes”.

A polícia está investigando se a “marcha da vitória” do rabino Kahane não deveria merecer a abertura de um novo processo. Nela, militantes do “Kach”, seu partido, amassaram um carro e ameaçaram os comerciantes árabes nas ruelas da velha cidade, a caminho do Muro das Lamentações. No jornal Davar, do Partido Trabalhista, foi publicado um raríssimo editorial na primeira página, assinado pelo seu editor, Hannah Zemer: “Nós devemos agir. Este é o dever do procurador jurídico do Estado. Precisamos remover esta marcha”.

O rabino Kahane anunciou logo depois de ser eleito que abriria um escritório de emigração na aldeia árabe de Umm-al-Fahm, dando inicio às suas deportações. Mas da aldeia foi divulgado um conselho a Kahane: “não se atreva a vir aqui”.

O prefeito de Belém, Elias Freij, já tinha um bom motivo de frustração – a derrota do Partido Trabalhista, que vencendo abriria o dialogo com o reino da Jordânia, de que é um dos súditos. Ele não podia imaginar a eleição do rabino Kahane:

— Isto é um fenômeno extremamente perigoso e revoltante. Kahane é um racista apelando para a expulsão dos árabes de terras onde eles estão vivendo há séculos. Como isto pode acontecer? Como se pode dar imunidade ao racismo?

No parlamento, diante de Kahane, deverá estar constantemente o bloco de sete deputados árabes também eleitos. Um deles, em especial, será uma vítima diária: o comunista Tawfik Toubi. Kahane está prometendo lembrá-lo:

— Toubi, pode preparar-se para partir deste país… Eu não terei maioria, mas só o fato de poder subir a tribuna e propor uma lei de expulsão dos árabes… Imaginem o que vai acontecer no parlamento, o que dirá o mundo… — ele comentava nesta semana.

O rabino meir Kahane formou-se em direito pela universidade de Nova York, em 1954. E foi entre a comunidade judaica dos Estados Unidos que começou a ficar célebre, ao fundar a Liga de Defesa Judaica, em 1968 – ele atacava com bombas objetivos considerados antissionistas.

Esta semana, os líderes da comunidade judaica americana compararam a ideologia de Meie Kahane á dos neonazistas, passando a chamá-lo de “Farakhan israelense” – o muçulmano negro Louis Farrakhan ativo na campanha do pastor Jesse Jackson.

Ele próprio, o rabino Kahane, que alguns israelenses dizem ser um “american export”, publicou um anúncio nos jornais para “o primeiro discurso”, cobrando um dólar de entrada. O que chama mais a atenção nele é a frase em negrito:

“Novo membro da Knesseth”.

(Mas 98.7 por cento dos israelenses não votaram nele.)

No túmulo do rabino Kahane (Foto: Yonatan Sindel/Flash90)

No túmulo do rabino Kahane (Foto: Yonatan Sindel/Flash90)

Morte em Manhattan

O rabino Kahane alertava os judeus ortodoxos de Nova York, em 5 de novembro de 1990: “Partam para Israel antes que seja muito tarde”. Ao final de seu apelo, enquanto uma pequena multidão o cercava, no segundo andar do hotel Marriott East Side de Manhattan, o egípcio-americano El Sayyid Nosair aproximou-se e lhe acertou um tiro mortal.

Nosair foi absolvido e libertado, porque a família do rabino Kahane não permitiu a autópsia que daria subsídios para incriminá-lo, com a extração da bala. Solto, ele se envolveu no primeiro atentado a bomba contra o World Trade Centre, em 1993 — e, de novo julgado, foi condenado à prisão perpétua. Na cadeia, ele confessou o assassinato de Meir Kahane.

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