Tanta corrupção, tão pouca memória.

Tentei manter o Museu da Corrupção com a ajuda de um crowdfounding.

Ganhei o primeiro não.

Procurei um crowdsourcing. Prometeram responder em dois dias.

Passsaram-se mais de 30. Segundo não.

Ofereci o texto abaixo para os dois jornalões de São Paulo.

Um o considerou uma pauta. O outro nem respondeu.

Depois de quatro nãos fiquei muito inseguro.

Então, resolvi anunciar

pelas redes sociais que o Museu da Corrupção,

no país da corrupção, vai fechar.

O Museu da Corrupção. Ele é virtual, mas foi projetado por um arquiteto.

O Museu da Corrupção. Ele é virtual, mas foi projetado por um arquiteto.

O Museu da Corrupção parou de se atualizar todos os dias. Não por falta do que expor. Com o Petrolão jorrando daria até para montar uma exibição diária. Também não por problema de espaço, que é ilimitado na internet, onde ele foi aberto há seis anos, no endereço www.muco.com.br

O Museu da Corrupção pode acabar, por falta de recursos. Tanto sucesso fez ao abrir, em 22 de abril de 2009, que, em 9 meses,recebeu o Prêmio Esso de Melhor Contribuição à Imprensa. A coincidência com a data da Descoberta do Brasil foi proposital: pesquisas confirmam que corruptores degregados e Pindorama surgiram com as primeiras caravelas.

No início, o MuCo requeria poucas horas do trabalho de uma pequena equipe. Mas agora, não mais, afogando no mar de lama dos propinodutos abertos na Petrobras.

O MuCo chegou a ter um milhão de visitantes por mês. Foi notícia aqui e lá fora, tido como antídoto à venenosa corrupção. Do mundo digital o MuCo baixou fisicamente no Largo de São Francisco, convidado pelos alunos de Direito da USP. Materializou-se com paineis e uma seção multimídia especial sobre a Maranhão dos Sarney. Por acaso, uma banca oferecia ali, quentinha, a Pizza Sarney, o bigodão de aliche – a mais concorrida do cardápio da virtual do museu, mas assada de verdade por um pizaiolo do Bexiga. Havia fila para comprar um pedacinho desse maranhão, sabor impunidade.

O MuCo nasceu contra a impunidade – as pizzas do Planalto. Quem segue as manchetes de jornais vê que o escândalo de hoje empurra o de ontem para escanteio. Alguém aí se lembra da Operação Navalha, em 2007? Foram soltos todos os 46 presos acusados de comprar licitações do PAC e do Luz para Todos. Quem sabe que fim levou o desvio de R$ 214 milhões da Sudam, em 1999? Entre 143 presos e soltos, o ex-senador Jáder Barbalho conseguiu até ser reeleito, em 2011.

A geração pós-1964 herdou depoimentos, documentos, imagens, livros, testemunhos, aulas, jornais e revistas – enfim, memória da ditadura militar que durou 21 anos. Reuniu conhecimento para responder às tentações antidemocráticas,cíclicas e não deverá, por suposto,repetir erros do passado.

    O Brasil supercorrupto é, principalmente, um desmemoriado; reelege políticos flagrados recebendo propina, ou que lavam $$ em paraísos fiscais. Suspeitos são postos a investigar o butim que eles próprios compartilharam. A referência para a história está pulverizada em muitos arquivos da PF, das CPIs do Congresso, de jornais e revistas, do STF, de blogs, dos institutos de combate à corrupção nacionais e internacionais, e da ONU.

Um propósito do MuCo é coletar, organizar e expor, centralizado, online, e com acesso gratuito, a corrupção e os corruptos, não os deixando escapar pelo esquecimento. Hoje uma torre só, o museu já poderia ser um condomínio. De jornais convidados a ter sua própria torre, 3 aceitaram, um apenas restou – o Lance, de olho nos escândalos do esporte, em tempos de Copa do Mundo e das Olimpíadas.

  Difícil acreditar que tanto se reclame da corrupção galopante no Brasil, e nada seja feito para preservar sua história. E ela vai aumentando cada dia mais: Mensalão, Petrolão, quem sabe Apagão? (da Eletrobras). É o seu dinheiro, o meu e o nosso coletado para Saúde, Educação, Desenvolvimento, ou para 39 ministérios, embolsado por uns poucos em postos-chave e com mandatos políticos, foro privilegiado.

Pai do MuCo, compartilho sua paternidade. Que ele tenha muitos pais! Importante é que exista, se desenvolva e se torne referência nacional para pesquisas e para a história da corrupção no Brasil. Com recursos, ele poderá transmitir ao vivo operações e alertas da PF, ou julgamentos no STF e CPIs no Congresso, e promover visitas guiadas por temas ou casos.

O MuCo criou uma galeria que expõe as obras de arte apreendidas de refinados lavadores de dinheiro. Poderia ainda esculpir em cera os maiores corruptos do Brasil, exibindo-os como as estátuas de Madame Tussauds, em Londres. O museu estava preparando um salão para o acervo do Petrolão, homenageando quem foi processado até morrer, em New York, por dizer que havia corrupção na Petrobras – o escritor e jornalista Paulo Francis. E ele estava certo!

            Já aconteceu algumas vezes: absolvidos, suspeitos pedem para sair de exposição. Ninguém quer integrar uma coleção permanente sobre corrupção. O MuCo tem esse poder de dissuasão. Mas há muito ainda a fazer. Se não for alimentado, renovado e desenvolvido, ele vai acabar fechando as portas. Será uma pena.

    Alguém quer ajudar? Algum mecenas? Alguma fundação? Alguma sugestão? Crowdfounding? Crowdsourcing? (Só não são bem-vindos empreiteiras, Petrobras, partidos politicos e órgãos do governo federal, estadual e municipal).

BEM-VINDA, CORRUPÇÃO!

Aceitamos corruptos e corruptores de portas abertas no Museu da Corrupção (MuCo). Mas estamos com um sério problema: a atual supersafra do Petrolão é muito maior do que podemos absorver.

O MuCo nasceu da constatação de que a corrupção que faz a manchete dos jornais de hoje relega a do dia anterior ao esquecimento. Vamos adiante, desmemoriados. Mas expor passado e presente escandalosos pode corrigir o futuro. É ferramenta para pesquisadores. Intimida corruptores.

O MuCo nasceu em 21 de abril de 2009, mais para coincidir com o dia seguinte, o do Descobrimento do Brasil, do que com o Dia de Tiradentes. A repórter Kássia Caldeira já pesquisava havia seis meses os processos e investigações da Polícia Federal, os arquivos de CPIs, da Justiça e dos jornais, e aprofundava mais em nosso passado imprevisível. Assim montamos o primeiro acervo.

O arquiteto Rodrigo Moreira

O arquiteto Rodrigo Moreira

Um historiador deu o mote para precipitar a estreia do MuCo: “A corrupção começou com as primeiras caravelas”. Portugal desterrava seus trambiqueiros em Pindorama. O editor de web Luiz Octávio formatou o conteúdo dentro do espaço projetado pelo arquiteto Rodrigo Araújo Moreira. A curadoria foi assumida por Regiane Bochichi, ex-AOL.

Em dois meses, o MuCo alcançou 1.839.765 page views. Em seis meses, ganhou o Prêmio Esso de Melhor Contribuição à Imprensa. Foi convidado a se exibir numa reunião da ONU, para o Mercosul, no Paraguai. Um grupo de Paris pediu, e ganhou, uma sala para expor la corruption française.

    Com um Congresso pródigo em corrupção, o MuCo teve que abrir uma galeria só para expor a produção diária de Brasília. Em outras salas, estão as operações da PF, o trabalho de CPIs, uma galeria especial para a arte apreendida com corruptos de bom gosto, uma biblioteca com integra de livros para baixar, alguns já esgotados, a pizzaria da ex-deputada Ângela Guadagnin em que a Sarney, o bigode feito de anchovas, é a mais apreciada. Há também uma lojinha, como em todo museu. Ela foi até disputada por interessados em vender produtos reais. Mas continua só vitrina, com cueca própria para esconder dólares, algemas preciosas, máquina de lavar dinheiro, camisas de colarinho branco, kit para escutas clandestinas e camisetas da hora. Cartões postais da Casa da Dinda e da mansão de Palocci, brasilienses; da refinaria de Pasadena, no Texas; e da Petrobras, no Rio e Pernambuco, entre outros, podem ser enviados do próprio MuCo. A Copa do Mundo deste ano ganhou uma área especial, alimentada pelo jornal Lance. Na sala de cinema passam vídeos e som coletados de várias fontes, inclusive da web. No depósito de ferramentas estão os telefones e e-mails de todos deputados e senadores.

O MuCo nunca teve nenhuma verba, ou investimento. E é uma pena que esteja hoje paralisado ante tanta corrupção jorrando da Petrobras. A alguns jornais, nas principais capitais do país, foi oferecido um anexo próprio, num conjunto de torres projetadas em torno do prédio inicial, já pequeno. Antes hospedado no recém-extinto Diário do Comércio, da Associação Comercial de São Paulo, era um espantalho: por que um jornal ia avalizar outro? E a concorrência? Agora liberado, o criador abdicando à sua criatura, ele poderia ser de todos, tipo Wikipédia. A forma de administrá-lo está aberta. Bobagem pensar em patrocínio. O Google o encamparia? Não, por incompatibilidade à sua operação no Brasil. Alguma empreiteira? Só por humor.

Agora, o MuCo (www.muco.com.br) também entrou no Facebook. Só como obra de todos, poderá crescer, digerir a corrupção que, de tanta, o imobilizou. Algumas ideias que aguardam condições de serem executadas: duas novas salas, uma para a Papuda, outra em homenagem a Paulo Francis, com a memória de suas denúncias sobre a Petrobras. Um museu de cera com os nossos corruptos mais conhecidos — forma eficaz de dissuadir futuros corruptores. Alguns suspeitos absolvidos revelaram o poder da memória preservada, pedindo à curadoria para acrescentar que foram julgados inocentes em casos de muita exposição. Em pouco tempo, a 9 de dezembro, será comemorado o Dia Mundial Contra a Corrupção. Hoje, o Brasil pode comemorar certo avanço contra a impunidade. Mas, e contra o esquecimento?DSC00429