Berkshires, MA -A enorme baleia branca boiava no alto do Monte Greylock, bem longe do oceano, em Pittsfield. Era só Herman Melville abrir a janela para avistá-la. Ele se sentia tão ao mar em Berkshires que descrevia seu quarto como a cabine de um navio. E nas noites de ventania continha o impulso de subir ao telhado para pegar a roda do leme, e enfrentar as ondas até ancorar num porto seguro.
Moby Dick ainda hoje está no horizonte, boiando imóvel a 1.064,06 metros do Monte Greylock, na Monument Mountain, o ponto mais elevado de Massachusetts. Não era um delírio do marujo-escritor Herman Melville, que vivia obcecado por baleias, o tema de um novo livro que já deveria ter enviado a seu editor em Londres.
Em dias claros, os turistas avistam Moby Dick da janela de Arrowhead, o casarão de uma fazenda de 1780, em Pittsfield, comprado por Herman Melville depois de participar de um piquenique no topo da Monument Mountain, em 5 de agosto de 1850, com o editor Evert Duyckinck, os escritores Oliver Wendell Holmes e Nathaniel Hawthorne, e o jurista David Dudley Field Jr. Ouviam a leitura da lenda de uma índia que pulou dali para a morte, o coração despedaçado pela paixão por um primo, quando desabou um temporal.
Melville, 32 anos, e Hawthorne, 46, buscaram abrigo juntos, enquanto Holmes servia champanha em canecos de prata. Tornaram-se dois grandes amigos, e um influenciou a obra do outro – sem que tenham antecipado a amizade entre os cowboys do filme Brokeback Mountain. O piquenique literário do século 19 virou um programa que ainda atrai escritores de Boston e Nova York. O lema é o de Holmes, e vale para todos os que decidem visitar Berkshires apenas para ouvir música em Tanglewood ou curar o corpo e a alma no Kripalu Center for Yoga and Health, em Lenox: “É preciso carregar as montanhas no cérebro”.
O marujo Melville foi funcionário de banco e vendedor numa loja de pele em Nova York, onde nasceu, até se alistar no baleeiro Acushnet para uma caçada de três anos a baleias, em 1841. Abandonou o barco nas Ilhas Marquesas, por brigar com o capitão, e ficou pulando de navio em navio, de porto a porto, só voltando à Nova York ao entrar para a Marinha americana.
Em terra firme, não sabia o que fazer da vida, mas tinha inúmeras boas histórias para contar. Os primeiros cinco livros o fizeram escritor. Mas nem o sucesso de Moby Dick lhe rendeu dinheiro suficiente para sustentar-se em Arrowhead com a família – a mulher, Lizzie, e quatro filhos. Até hoje best-seller, só lhe rendeu, enquanto vivo, meros US$ 589. Teve que abandonar a sua bucólica vida. Pelos 20 anos seguintes trabalhou como inspetor de alfândega em Nova York. Nunca mais escreveu prosa, só poesia – e sua musa foram os tempos em Berkshires. Morreu em 1891. Seus últimos escritos apareceram publicados apenas 33 anos depois.
Arrowhead foi comprada pela Sociedade Histórica em 1975. Curioso o endereço que cruza uma grande amizade: 780 Holmes Road, Pittsfield MA – 01201.
Baleias à proa!
Moby Dick bóia no Mount Greylock, congelada no tempo. Mas a 4 horas de ônibus de Stockbridge, no Porto de Boston, partem cruzeiros para Stellwagen Bank, um ponto no mar em que baleias de vários tipos se encontram, e aparecem para as fotografias.
O barco tem uma área grande com ar-condicionado e cadeiras, bar, banheiros limpos, e especialistas em baleias simpáticos explicando o que todos estão vendo, às vezes mais além do que o necessário, porque, sob silêncio, ouvem-se as baleias assoviando, e até o barulho de seus mergulhos.
O passeio dura três horas. Muita brisa marinha, sol forte, os passageiros que não comeram o fast-food a bordo estão prontos para um dos ótimos restaurantes de Boston.
Quem embarca para ver baleias, a US$ 35 os adultos, e US$ 29, crianças, receberá um ticket para outra próxima viagem, se não avistar nenhuma. A propaganda promete “garantia de baleias”, ou o ticket de volta.