REVELADO O PLANO DOS EUA PARA A PAZ EM GAZA

Eis o plano de 21 pontos para acabar com a guerra em Gaza que o presidente Donald Trump elaborou com oito países árabes e vai apresentar ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu nessa segunda-feira.
O plano foi obtido pelo jornal Times of Israel que certificou sua autenticidade com duas fontes diferentes. Nele há pontos que devem desagradar a Israel, ao Hamas e a Autoridade Palestina. Mas não há plano possível que agrade a todos.
Os 21 pontos foram traduzidos por IA porque extensos e para que possam ser conhecidos imediatamente.


PLANO DE 21 PONTOS
O conteúdo do plano foi parafraseado a pedido das fontes que o forneceram.
 1.⁠ ⁠Gaza será uma zona desradicalizada, livre de terrorismo e não representará uma ameaça aos seus vizinhos.
 2.⁠ ⁠Gaza será reconstruída para o benefício de seu povo.
 3.⁠ ⁠Se ambos os lados concordarem com a proposta, a guerra terminará imediatamente, com as forças israelenses interrompendo todas as operações e se retirando gradualmente da Faixa de Gaza.
 4.⁠ ⁠Dentro de 48 horas após Israel aceitar publicamente o acordo, todos os reféns vivos e mortos serão devolvidos.
 5.⁠ ⁠Assim que os reféns forem devolvidos, Israel libertará centenas de prisioneiros de segurança palestinos que cumprem penas de prisão perpétua e mais de 1.000 moradores de Gaza presos desde o início da guerra, juntamente com os corpos de centenas de palestinos.
 6.⁠ ⁠Assim que os reféns forem devolvidos, os membros do Hamas que se comprometerem com a coexistência pacífica receberão anistia, enquanto os membros que desejarem deixar a Faixa de Gaza receberão passagem segura para os países receptores.
 7.⁠ ⁠Uma vez alcançado esse acordo, a ajuda chegará à Faixa a taxas não inferiores às metas estabelecidas no acordo de reféns de janeiro de 2025, que incluía 600 caminhões de ajuda por dia, juntamente com a reabilitação de infraestrutura crítica e a entrada de equipamentos para remoção de escombros.
 8.⁠ ⁠A ajuda será distribuída — sem interferência de nenhum dos lados — pelas Nações Unidas e pelo Crescente Vermelho, juntamente com outras organizações internacionais não associadas a Israel ou ao Hamas.
(O texto desta cláusula parece intencionalmente vago e aparentemente deixa uma abertura para a operação contínua da Fundação Humanitária de Gaza, já que tecnicamente é uma organização americana, mesmo tendo sido uma criação de israelenses ligados ao governo e criada para se adequar à condução da guerra pelo governo israelense.)
 9.⁠ ⁠Gaza será governada por um governo temporário e transitório de tecnocratas palestinos, responsáveis por fornecer serviços diários à população da Faixa de Gaza. O comitê será supervisionado por um novo organismo internacional estabelecido pelos EUA em consulta com parceiros árabes e europeus. Ele estabelecerá uma estrutura para o financiamento da reconstrução de Gaza até que a Autoridade Palestina conclua seu programa de reformas.
(Esta é a primeira menção do plano dos EUA à Autoridade Palestina, sediada em Ramallah. Israel descartou a autoridade como potencial governante de Gaza, rejeitando assim o que se tornou a chave para recrutar assistência árabe na gestão pós-guerra da Faixa, visto que a comunidade internacional considera a unificação da Cisjordânia e de Gaza sob um único órgão de governo reformado como essencial para a estabilidade e a paz a longo prazo. A aparente decisão de reservar o papel da AP para uma data posterior não especificada provavelmente será difícil para Ramallah engolir, mas também tem influência limitada nessas discussões.)
10.⁠ ⁠Um plano econômico será criado para reconstruir Gaza por meio da convocação de especialistas com experiência na construção de cidades modernas no Oriente Médio e por meio da consideração de planos existentes que visam atrair investimentos e criar empregos.
11.⁠ ⁠Será estabelecida uma zona econômica, com tarifas reduzidas e taxas de acesso a serem negociadas pelos países participantes.
12.⁠ ⁠Ninguém será forçado a deixar Gaza, mas aqueles que optarem por sair poderão retornar. Além disso, os moradores de Gaza serão incentivados a permanecer na Faixa de Gaza e terão a oportunidade de construir um futuro melhor lá.
13.⁠ ⁠O Hamas não terá qualquer papel na governança de Gaza. Haverá o compromisso de destruir e interromper a construção de qualquer infraestrutura militar ofensiva, incluindo túneis. Os novos líderes de Gaza se comprometerão com a coexistência pacífica com seus vizinhos.
14.⁠ ⁠Uma garantia de segurança será fornecida pelos parceiros regionais para garantir que o Hamas e outras facções de Gaza cumpram suas obrigações e que Gaza deixe de representar uma ameaça a Israel ou ao seu próprio povo.
15.⁠ ⁠Os EUA trabalharão com parceiros árabes e outros parceiros internacionais para desenvolver uma força internacional temporária de estabilização , que será imediatamente enviada a Gaza para supervisionar a segurança na Faixa de Gaza. A força desenvolverá e treinará uma força policial palestina, que servirá como um órgão de segurança interna de longo prazo.
16.⁠ ⁠Israel não ocupará nem anexará Gaza, e as IDF entregarão gradualmente o território que ocupam atualmente, à medida que as forças de segurança substitutas estabelecerem o controle e a estabilidade na Faixa.
17.⁠ ⁠Se o Hamas atrasar ou rejeitar esta proposta, os pontos acima prosseguirão em áreas livres de terrorismo, que as IDF entregarão gradualmente à força internacional de estabilização.
(Esta é a primeira menção à possibilidade de que o acordo possa ser implementado pelo menos parcialmente, mesmo que o Hamas não concorde.)
18.⁠ ⁠Israel concorda em não realizar futuros ataques no Catar. Os EUA e a comunidade internacional reconhecem o importante papel mediador de Doha no conflito de Gaza.
19.⁠ ⁠Será estabelecido um processo para desradicalizar a população. Isso incluirá um diálogo inter-religioso com o objetivo de mudar mentalidades e narrativas em Israel e Gaza.
20.⁠ ⁠Quando a reconstrução de Gaza tiver avançado e o programa de reforma da AP tiver sido implementado, as condições poderão estar reunidas para um caminho confiável para a criação de um Estado palestino, que é reconhecido como a aspiração do povo palestino.
(A cláusula não fornece detalhes sobre o programa de reforma palestina e não é definitiva sobre quando o caminho para a criação de um estado pode ser estabelecido.)
21.⁠ ⁠Os EUA estabelecerão um diálogo entre Israel e os palestinos para chegar a um acordo sobre um horizonte político para a coexistência pacífica.

Palestina, Gaza e Ucrânia nos 80 anos da Assembleia Geral

A Palestina vai ser reconhecida pela França, Grã-Bretanha, Austrália e Canadá, aumentando para 146 os países que já a reconhecem, nesta segunda-feira, véspera da Assembleia Anual de 80 anos da ONU, chamada de Copa do Mundo da Diplomacia.
Mas o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, não estará presente ao histórico reconhecimento da Palestina, promovido pela França e Arábia Saudita, porque teve o visto negado para desembarcar em Nova York, por alegada questão de segurança nacional. Ele poderá discursar por vídeo-conferência.
Na lista de países que reconhecem a Palestina faltam dois fundamentais para que ela passe do papel à existência: Israel e Estados Unidos.

A gestação de dois estados na Palestina, um israelense e outro palestino, começou em 29 de novembro de 1947, com a Resolução 181, aprovada por 33 votos a 13, e 10 abstenções, pela Assembleia Geral da ONU. Mas o parto já dura 75 anos, sem previsão para o nascimento da Al Quds, a Sagrada, como os palestinos a batizaram.
Israel está chegando ao segundo ano de guerra em Gaza, depois de invadido por milhares de palestinos que deixaram 1.200 mortos de 40 nacionalidades, inclusive brasileiros, e 250 reféns, 20 dos quais que ainda podem estar vivos. Do lado palestino, morreram cerca de 65 mil pessoas, entre civis e combatentes, mulheres e crianças, segundo o Ministério da Saúde do Hamas.
O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu diz que nunca haverá um estado palestino. E a cada dia que passa o território da Palestina fica menor, ocupado por colonos com permissão de construir novas casas nas “terras que lhes foram dadas por Deus”, as bíblicas Judeia e Samaria, hoje Cisjordânia, conquistada na Guerra de Seis Dias, em 1967.
Para os Estados Unidos, e principalmente para o presidente Donald Trump, um reconhecimento da Palestina não vale nada, se não negociado entre Israel e a Autoridade Palestina. O secretário de Estado Marco Rubio considera um encorajamento ao Hamas a iniciativa da França e da Arábia Saudita desta segunda-feira, sob o nome de Declaração de Nova York”.


O Departamento de Estado retardou o visto da delegação brasileira, que tradicionalmente abre as assembleias anuais da ONU. O primeiro discurso dos 80 anos será do presidente Lula. E o segundo, do presidente Trump.
Na Seção 11 do acordo de 16 páginas entre a ONU e EUA, de 1947, está escrito: “as autoridades federais, estaduais ou locais dos Estados Unidos não imporão quaisquer impedimentos ao trânsito de ou para o distrito da sede.”
Em 1988, porém, o líder da OLP, Yasser Arafat, foi barrado, mas liberado nos anos seguintes. Os vistos para delegações da Rússia, Irã, China e Venezuela demoram, mas saem. As rejeições são raras. Em 2014, o visto para um embaixador iraniano foi negado porque ele teria participado do cerco à embaixada estadunidense de Teerã, em 1979.
Para os participantes da Assembleia Geral que não sejam bem-vindos aos EUA há uma restrição: eles não podem se afastar de um raio de 22 quilômetros da sede da ONU.
A Assembleia Geral, a partir de terça-feira, deverá ser dominada pelas guerras em Gaza, na Ucrânia e no Sudão. Mas o tema geral escolhido é “Melhor juntos: 80 anos e mais para paz, desenvolvimento e direitos humanos” — em contraposição ao unilateralismo do America First, de Trump, que tirou os EUA da OMS, da UNESCO, do Conselho de Direitos Humanos e do acordo do clima de Paris, que este ano fará sua reunião no Pará.

Mortes e acordos entre Israel-Síria-Jordânia e Libano.

Foto do exército de Israel, hoje, na Ponte Allenby

Um jordaniano que dirigia um caminhão carregado com ajuda humanitária para Gaza estacionou para inspeção israelense na Ponte Allenby, perto de Jericó, na Cisjordânia. Tinha um revólver. E o disparou até ele não funcionar, engasgado com uma bala. Então, sacou uma faca e matou duas pessoas, uma de 60 e outra de cerca de 20 anos. Foi morto. A passagem entre Jordânia e Israel foi fechada.

(Em Gaza, quase ao mesmo tempo, um comandante e três oficiais foram mortos ao passarem sobre uma mina improvisada.)
Ano passado, nessa mesma ponte Allenby, três israelenses morreram baleados, também por um motorista de caminhão jordaniano de alimentos para Gaza.
Algumas horas depois do atentado desta quinta-feira, o ministro de Assuntos Estratégicos, Ron Dermer, confidente do premiê Benjamin Netanyahu, sugeriu que o Vale do Jordão pode ser anexado sem maiores consequências, se for uma reação ao reconhecimento do estado da Palestina, na semana que vem, na Assembleia Geral da ONU, em Nova York. A expectativa sobre a reação dos Emirados Árabes Unidos foi reduzida a uma retirada de seu embaixador de Tel-Aviv, não mais uma ruptura.


O ministro Dermer esteve negociando um pacto de convivência entre Síria e Israel, em Londres, onde também se encontrou com o secretário de Estado Marco Rubio, que esteve em Jerusalém e Doha, no Catar, há poucos dias. Não foi a primeira vez que ele propôs a anexação de parte da Cisjordânia, mas a que tem mais chance de ocorrer, antecipada pelo próprio premiê Netanyahu e exigida, praticamente, por seus aliados da extrema-direita na coligação governamental.
O presidente sírio Ahmed al-Sharaa revelou-se otimista com as negociações com o ministro Dermer, nesta quinta-feira, prevendo um acordo para “os próximos dias”. Para ele, o pacto é necessário para acabar com as incursões aéreas e terrestres do vizinho israelense. Mas não está claro como foi ou será resolvido o impasse sobre as Colinas do Golã, anexadas por Israel depois de conquistadas, na Guerra dos Seis Dias (1967).
Em Londres, o primeiro-ministro Keir Starmer e Trump concordaram em discordar sobre o reconhecimento da Palestina, durante uma entrevista coletiva, nesta quinta-feira. O Reino Unido iria se antecipar à França, anunciando-o antes. Mas a recepção real ao presidente dos EUA o dissuadiu.
Ao afirmar que “o Hamas não deve ser parte de nenhum futuro governo na Palestina”, o que não impedirá o seu reconhecimento, Starmer recebeu um tapinha nas costas de um Trump satisfeito, e que declarou: “Discordo do primeiro-ministro (sobre reconhecer a Palestina) … É um nossos poucos desacordos.” Ele acrescentou que os reféns cativos do Hamas devem ser libertados imediatamente: “Não um, não dois ou ‘vamos lhe dar dois amanhã’. Temos que receber os reféns imediatamente. É isso que o povo de Israel quer. E queremos que a guerra acabe, e ela vai acabar”.


Israel distribuiu panfletos no sul do Líbano, na manhã desta quinta-feira (foto acima): “Aviso urgente”, alertou em árabe. “As IDF (Forças de Defesa de Israel) atacarão a infraestrutura militar pertencente ao terroristas Hezbollah em todo o sul do Líbano, para combater suas tentativas proibidas de reconstruir suas atividades”. Num mapa, foram indicados os edifícios que seriam atacados em Kafr Tibnit e Dubna, recomendando a seus moradores a permanecer a uma distância de 500 metros.

Um fim de semana trágico paira sobre Israel

(Venice) La distruzione del tempio di Gerusalemme -Francesco Hayez – gallerie Accademia Venice

Ao pôr do sol de sábado terá início o dia destinado à tragédia para os judeus de Israel e do mundo. É o Tishá B’Av, o 9 Av, no calendário lunar hebraico.

Ao longo de séculos, o 9 Av marcou a destruição dos dois templos de Jerusalém, em 586 a.C. e 70 d.C.; a matança de meio milhão de judeus pelos romanos na cidade de Betar, em 135 d.C.; a expulsão dos judeus da Inglaterra (1290), da França (1306) e da Espanha (1942); o início da Primeira Guerra Mundial (1941) e as deportações do Gueto de Varsóvia para o campo de extermínio nazista de Treblinka (1942).

Que nova tragédia pode acontecer no 9 Av deste ano, além da já trágica guerra em Gaza, que chega ao seu 666º dia no sábado?

O professor de História e escritor Yuval Noah Harari previu a destruição metafórica do “terceiro templo” se o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu continuar no poder em Israel. Foi quando ele discursou para manifestantes contra o governo:

“Basta Bibi! (o apelido de Netanyahu). Vocês não estão destruindo apenas o Estado de Israel, mas todo o povo judeu (…) Todas as comunidades judaicas, de Nova York a Sidney, terão de decidir se se mantém fiéis aos valores de ‘amarás o teu próximo como a ti mesmo’, ou se se alinham com o novo judaísmo negro que está sendo criado, o judaísmo dos incendiários de Huwara” (cidade palestina, em Nablus, na Cisjordânia, atacada por colonos judeus, em 2023.)

Então, Harari concluiu: “Não dá para esperar por Tishá B’Av e pela destruição do Templo. A hora de parar o governo Netanyahu é agora”.

A primeira da série de tragédias em 9 Av é contada no Livro de Números, capítulos 13 e 14. O povo de Israel estava acampado à entrada da Terra Prometida, por volta de 1.500 a.C., à espera do relato dos 12 espiões enviados por Moisés para explorar Canaã. Só dois dos espiões, Josué e Calebe, trouxeram um relato positivo. Os outros dez viram habitantes gigantes em cidades fortificadas, o que gerou pânico e descrença. Os israelitas choraram. E então, segundo um texto rabínico, Deus falou:

“Vocês choraram diante de mim sem motivo, eu fixarei para vocês (este dia com um dia de) choro para as gerações”. Era um 9 Av. E os judeus, punidos, peregrinaram pelo deserto durante 40 anos, até o fim da geração que duvidou de Deus.

O profeta Jeremias atribuiu a destruição do Primeiro Templo pelos babilônios aos “pecados do rei, dos líderes da nação e do povo de Judá, bem como à falta de arrependimento”. Por uma interpretação moderna, o Segundo Templo caiu por ações de extremistas, que “nunca veem ou querem ver as consequências de suas ações”. Outra causa para as catástrofes de 9 Av é que “a História não ocorre por acaso; os acontecimentos — mesmo os terríveis — são parte de um plano divino, e têm um significado espiritual”.

As tragédias coincidentes num mesmo dia ao longo do tempo são reais, registradas em documentos históricos, descobertas arqueológicas e relatos cronológicos. A História analisa causas políticas, econômicas e sociais, mas não faz um juízo religioso. As visões histórica e teológica podem se complementar, para muitos estudiosos.

Em 9 Av, 1941, o comandante Heinrich Himmler recebeu a aprovação do Partido Nazista para a Solução Final, que marcou o início do Holocausto. Em 10 Av de 1994, uma bomba explodiu no centro comunitário judaico da AMIA, em Buenos Aires, matando 85 pessoas. Em 1995, o premiê Yitzhak Rabin foi assassinado por um fanático judeu de extrema direita. E em 9 Av de 2005 Israel se retirou de Gaza, abrindo o caminho para a vitória do Hamas em 2006 e a expulsão da Autoridade Palestina (AP) para Ramallah, na Cisjordânia.

Agora, em 2025, o povo judeu está vivendo várias causas para a produção de uma nova catástrofe em Tishá B’Av. O pensador israelense-americano, Doron Weber, fez uma lista em que destaca que o governo de Benjamin Netanyahu minou a coesão militar de Israel; abalou a sua economia; rompeu o tecido social; deu liberdade a colonos judeus para atacar palestinos na Cisjordânia; prejudicou as relações com os EUA e alienou os judeus da diáspora, que estão sofrendo uma onda antissemita no mundo todo. Israel, hoje, é um vilão internacional, um pária, isolado de seus amigos e aliados.

A observância do Tishá B’Av é tão rigorosa, para os judeus, quanto o Yom Kippur, o Dia do Perdão. O jejum começa ao pôr do sol do sábado, e deve ser mantido por 25 horas. Não se pode tomar banho, passar cremes ou óleos no corpo, usar sapatos de couro, ter relações sexuais, trabalhar, cumprimentar pessoas e dar presentes. Nas sinagogas, lê-se o Livro de Lamentações e lembra-se a destruição dos dois templos de Jerusalém, dos quais resta o Muro das Lamentações. Os oito dias que antecedem o 9 Av são de luto, não se come carne nem se toma vinho, não se usa roupa nova e nem se participa de festas.

O Tishá B’Av poderá se tornar um dia alegre, se o Terceiro Templo for construído. No lugar dele, porém, estão hoje as mesquitas de Al-Aksa e do Domo da Rocha, de onde Maomé subiu aos céus num cavalo alado. Jerusalém, ou Al Quds (A Santa, para os muçulmanos), é a cidade disputada para capital por israelenses e palestinos.

No Oriente Médio, Estado e Religião se embaralham. Em muitos países árabes, o islamismo serve como base moral, política e estrutura legal. Em Israel, “um Estado judeu e democrático”, os partidos religiosos têm uma influência muito grande em decisões políticas. Atualmente, dois ministros ultra religiosos e radicais de direita ameaçam derrubar a coligação que sustenta o premiê Netanyahu, que está com um único voto de maioria no Parlamento, se ele aceitar o fim da guerra sem exterminar o Hamas e criar colônias judaicas em Gaza.

Entre religiosos judeus circula os versículos 51-55, do livro de Números, capítulo 33, em que Deus diz a Moisés:

“Quando vocês atravessarem o Jordão para entrar em Canaã, expulsem da frente de vocês todos os habitantes da terra. Destruam todas as imagens esculpidas e todos os ídolos fundidos e derrubem todos os santuários locais deles. Tomem posse da terra e instalem se nela, pois eu dei a vocês a terra para que dela tomem posse. Distribuam a terra por sorteio, de acordo com os seus clãs. Aos clãs maiores, vocês darão uma herança maior; aos menores, uma herança menor. Cada clã receberá a terra que lhe cair por sorte. Distribuam na entre as tribos dos seus antepassados. Se, contudo, vocês não expulsarem os habitantes da terra, aqueles que vocês permitirem ficar se tornarão farpas nos seus olhos e espinhos nas suas costas. Eles causarão problemas para vocês na terra em que vocês irão morar.”

Que o Tisha B’Av de 2025 (ou 5785, no calendário hebraico) passe sem novas tragédias.

Catargate

Copa do Mundo

e guerra em Gaza

se encontram no

CATARGATE

Quem poderia imaginar que a defesa da Copa de 2022, no Catar, tenha sido elaborada no gabinete do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, em Jerusalém? Só hoje as revelações estão aparecendo, num processo chamado Catargate.
Israel e o Catar são, tecnicamente, países inimigos. Mas, depois da invasão do Hamas em 7 de outubro de 2023, delegações israelenses vão à Doha negociar a libertação de reféns e o cessar-fogo em Gaza, com mais egípcios e americanos.


Nesta segunda-feira, Netanyahu prestou esclarecimento no processo do Catargate. Dois de seus assessores tiveram a detenção estendida por mais dois dias.
Antes de procurar quem poderia mudar a imagem do Catar para a Copa do Mundo, o líder catariano, Xeque Tamim bin Hamad Al-Thani, já tinha ligações com israelenses. Ele mandava milhões de dólares de ajuda para Gaza, desviados para o Hamas. Era uma estratégia de Netanyahu: fortalecer o Hamas, que propagava a destruição de Israel, e desprezar a Autoridade Palestina, em Ramallah, na Cisjordânia ocupada, que concordava com uma solução de dois estados.
A campanha online secreta pró-Catar foi investigada a fundo pelo jornal israelense Haaretz. Dois assessores do gabinete do primeiro-ministro, Yonatan Urich e Srulik Einhorn, donos da empresa Perception, criaram vinte perfis falsos em redes sociais (avatares), websites e blogs, para combater o histórico catariano de infrator de direitos humanos (6.500 trabalhadores teriam morrido na construção dos estádios para Copa) e desestabilizador no Oriente Médio, além de protetor do grupo terrorista Hamas.
O objetivo, segundo o Haaretz, era “lavar a imagem do Qatar” e “mudar o discurso sobre o emirado. O nome do projeto: Lighthouse (Farol). A empresa israelense Koios, que se diz focada em prevenção de fraude e investigação financeira online, executou a campanha. O email de um homem ligado à inteligência militar israelense, Idan Shance, registrou o site de notícias falsas, Worldwide & Business News, que oferecia empregos a “trabalhadores de língua alemã”, pois a torcida na Alemanha era considerada um público-alvo.

O Emir do Catar e o premier de Israel, Netanyahu.


À medida que o jornal Haaretz contatava empresas criadas para o Projeto Farol, elas simplesmente desapareciam. Yonatan Urich e Eli Feldstein foram detidos e interrogados pela polícia sob a suspeita de contato com um agente estrangeiro, fraude, lavagem de dinheiro e suborno. O pagamento do Catar para a campanha era transferido por um lobista do governo catariano para Israel. O primeiro-ministro Netanyahu foi informado de uma transferência de 4 milhões de dólares para o braço militar do Hamas. O dinheiro vivo, para evitar rastreamento, começou a entrar em Gaza desde 2018.
O Catar nega todas as informações reunidas por Israel. O primeiro-ministro Netanyahu desmente a sua participação, enquanto responde a três processos por corrupção na Corte de Tel Aviv. Ele disse ontem que seus dois assessores, Yonatan Urich e Eli Feldstein, que estão presos, “são reféns acusados num processo politicamente motivado”. Ele acrescentou que “a única razão das investigações é a de evitar a demissão do chefe do Shin Bet”, Ronen Bar, que foi suspensa pela Suprema Corte de Justiça. O substituto indicado anteontem, general Eli Sharvit, foi defenestrado ontem.

GUERRA EN GAZA

IMPASSE:
HAMAS QUER LIBERTAR 5 REFÉNS.
ISRAEL QUER 11.

O Hamas aceita libertar cinco reféns vivos em troca de uma trégua de 50 dias. Israel quer que sejam libertados 11. O Egito está tentando um meio termo entre as duas propostas. Mas a guerra continua, porque o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, acredita que, sob fogo, as negociações ficam mais eficazes.
É o que declarou Netanyahu no início de uma reunião dominical de seu gabinete: “A pressão militar está funcionando”. E ele acrescentou que vê “rachaduras” na posição do Hamas.
Assim será o fim da guerra que entra no 7º mês com mais de 50 mil mortos, na visão de Netanyahu: “O Hamas vai depor suas armas. Seus líderes terão permissão para deixar Gaza. Nós cuidaremos da segurança geral e permitiremos a implementação do plano Trump” — o plano de imigração voluntária”, que antes foi concebido como uma Riviera no Oriente Médio, com a deportação da população palestina para países árabes.
Um dos negociadores do Hamas, Khalil al-Hayya, disse, neste sábado: “Não queremos nada de novo. Queremos respeitar o que foi assinado, o que os fiadores garantiram e que a comunidade internacional aprovou”. Ele se referiu ao que constava no primeiro acordo de cessar-fogo, prevendo que num segundo tempo Israel se retiraria de Gaza e todos os reféns, 24 vivos e 35 mortos, seriam devolvidos. Israel cumpriu a primeira parte mas não a segunda, porque seu objetivo sempre foi de só encerrar a guerra com o extermínio ou a rendição do Hamas.
Khalil al-Hayya, no entanto, sabe que não existe mais a opção do acordo de três fases assinado em janeiro. Por isso, ele disse que a nova proposta egípcia foi aceita pelo Hamas. No primeiro e último encontro inédito com um emissário da Casa Branca, em Doha, no Catar, a liderança palestina havia concordado em libertar o soldado israelense-americano refém, Edan Alexander. Mas o negociador dos EUA, Steve Witkoff, rejeitou o acordo, porque sua simples existência enfureceu Netanyahu, que se nega a dialogar com uma organização que considera terrorista.
Nem o Hamas e nem Israel divulgaram as propostas de cessar-fogo que receberam dos mediadores egípcios e catarianos. A imprensa no Oriente Médio cita a oferta de libertação de cinco reféns e a contraproposta de libertar 11, como o impasse atual. Netanyahu aproveitou a reunião de seu gabinete para se vangloriar de estar “comprometido em trazer de volta os reféns”, ao contrário do que dizem as famílias dos reféns e a oposição. Foi mais além, dizendo que o que funciona é a combinação de pressão militar e diplomática, “e não todas as reivindicações e slogans vazios que ouço nos estúdios (de TV) dos especialistas”.
Sobre o Líbano, advertiu: “Ele tem que garantir que nenhum ataque contra Israel saía de seu território”. Ao presidente e amigo Donald Trump ele agradeceu os ataques contra os Houthis, no Iêmen, que continuam disparando mísseis balísticos contra Israel, mandando milhares de israelenses para abrigos antiaéreos.
O Hamas começou neste fim de semana a se vingar de palestinos que marcharam, na semana passada, pela primeira vez, pedindo paz, em Gaza. As notícias, publicadas em jornais deste domingo, dão conta de que seis manifestantes foram executados, mas só identificam um deles, Odai al-Rubai, 22, que convocou alguns dos protestos.

Guerra em Gaza

Gaza vista do espaço (Foto Nasa)

Israel e Hamas discutem novo cessar-fogo

As negociações para um novo cessar-fogo em Gaza, dadas como mortas, estão emitindo alguns sinais de vida no Egito e no Catar. Israelenses e palestinos reagiram, positivamente, a um primeiro esforço diplomático de ressuscitação.

O Egito diagnosticou “indicações” esperançosas por parte de Israel, que rompeu o cessar-fogo e não o quis estender por mais 42 dias, como previa o acordo original de janeiro.

No Catar, uma fonte palestina declarou à Agência France Presse: “Uma reunião começou esta noite (quinta-feira) entre mediadores egípcios e uma delegação do Hamas para solidificar um cessar-fogo”.

Uma proposta à mesa incluiria a libertação de cinco reféns israelenses por semana, trocados por prisioneiros palestinos. Há 59 reféns cativos do Hamas, dos quais 24 estariam vivos. Aí seriam 12 semanas de cessar-fogo.

Antes, porém, um soldado refém israelense, com cidadania americana, Edan Alexander, deverá ser libertado para que o presidente Donald Trump proclame, desde Washington, a retomada das negociações. Um enviado da Casa Branca já tinha obtido a sua libertação, em negociações diretas e inéditas com o Hamas, em Doha, invalidadas porque os EUA não podem manter contatos diretos com uma organização listada como “terrorista” pelo seu Departamento de Estado.

A sobrevida do novo cessar-fogo, se obtido, não deve durar se Israel não flexibilizar sua posição de que a guerra só acabará com a derrota total do Hamas. Por outro lado, o Hamas exige a retirada israelense de toda a Faixa de Gaza. Um meio termo poderá ser o exílio da liderança palestina em algum país árabe, como aconteceu com o líder da OLP, Yasser Arafat, no Líbano, em 1983, quando ele partiu para a Tunísia num navio de nome emblemático para a Palestina: era o Atlântida, nome da ilha perdida, descrita por Platão no século IV a.C..

Ataque em hospital causou incêndio em Gaza REUTERS/Hussam Al-Masri

O que retirou o cessar-fogo moribundo do leito de morte? A pressão sobre o Hamas cresceu, sob fogo pesado de Israel. Tudo indica que, ao se retirar de Gaza, menos do Corredor Filadélfia, os soldados israelenses plantaram espionagem digital em vários pontos estratégicos. Explica-se, assim, como vários chefes palestinos foram assassinados em poucos dias. A frota de caminhonetes brancas, vistas na invasão de 7 de outubro e nas cerimônias de libertação de reféns, foi totalmente destruída pela aviação e por drones.

Uma das principais razões que devolve o Hamas à mesa de negociações é o protesto dos palestinos de Gaza, cansados de guerra, as casas destruídas, usados como escudos de proteção de combatentes escondidos em túneis. Quilômetros de túneis no subsolo de Gaza, e nenhum abrigo antiaéreo sobre a areia do deserto. O Hamas disse que os protestos inéditos, iniciados há três dias, eram contra guerra. Mas a multidão gritou: “Fora, Hamas; Fora, Hamas”, além de bordões contra Israel.

E o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu? O que o leva a aceitar um novo cessar-fogo? As famílias dos reféns, com milhares de israelenses as apoiando, não parou de se manifestar em Israel, na ONU, na Casa Branca, desde 2023. A sua casa oficial, na rua Gaza, em Jerusalém, vive sitiada por protestos. Ao romper o cessar-fogo, o partido da direita ultranacionalista, Poder Judeu, voltou à coligação do governo, reforçando-o com uma robusta maioria de votos para aprovar o orçamento deste ano, que, se rejeitado, o derrubaria.

Netanyahu tem problemas pela frente, como o Catargate, os milhões de dólares do Catar que transitaram em malas pelo seu gabinete, para o Hamas e para, ao menos, um porta-voz do governo, próximo do primeiro-ministro, que trabalhou a imagem de país amigo de organizações terroristas, em que trabalhadores escravos estavam morrendo, as mulheres sofriam opressão e repressão, para o país que sediou a Copa do Mundo de 2022, agora um mediador da paz e com relações diplomáticas com o mundo todo.

Netanyahu também é réu em três processos de corrupção e está afastando a Comissão de Inquérito independente que vai investigar as falhas que levaram à invasão do Hamas, em outubro de 2023, o quanto pode, porque, certamente, ele será um dos responsabilizados, como o foi a primeira-ministra Golda Meir depois da Guerra do Yom Kippur, em 1973. Netanyahu agora se dedica às demissões do chefe da espionagem interna, o Shin Bet, e a procuradora-geral, que podem lhe trazer complicações. Esta semana, ele passou pelo Parlamento um projeto que dá ao executivo o direito de escolher os futuros juízes. Antes, ele precisava da guerra para se manter no poder; agora, ele tem que libertar os reféns, para acalmar as manifestações em Israel, onde 60% dos eleitores não votariam nele numa próxima eleição.

Guerra em Gaza

Êxodo e protesto contra o Hamas. Em Gaza.

Foto do jornal Yedioth Aharonot
(Foto publicada pelo jornal Yedioth Aharonot)

Mais de 35 mil palestinos já foram embora de Gaza para um outro país, por vontade própria, desde o início da guerra em 2023, e 200 outros, doentes, devem partir para os Emirados Árabes Unidos nesta quinta-feira do aeroporto Ramon, a 18 quilômetros ao Norte de Eilat. Segundo Israel, há milhares de gazenses dispostos a partir nas próximas semanas.
Centenas de gazenses sobreviventes da guerra, que matou quase 51 mil mulheres, crianças, idosos, jovens civis e 20 mil combatentes, iniciaram um movimento inédito na terça-feira, repetido nesta quarta-feira ao meio-dia: marcharam pelas ruínas de Beit Lahia e Beit Hanoun, no norte de Gaza, protestando contra o Hamas. Nos cartazes, bordões como “O sangue de nossas crianças não é barato”, ou “Pare a guerra imediatamente”.
O movimento de palestinos contra o Hamas, que inclui protestos contra Israel, foi batizado de “Intifada do Norte” – e intifada, em árabe, pode ser traduzido por resistência, embora usado também como “agitar” ou “sacudir”. Contra Israel já houve duas intifadas, ou rebeliões. O Hamas, que sempre reprimiu protestos, não impediu as duas manifestações até agora.
O ministro da Defesa israelense, Israel Katz, está insuflando a Intifada do Norte. Ele disse aos gazenses, ontem, que a única maneira de pôr fim à guerra é a remoção do Hamas e a libertação dos reféns ainda em Gaza, que seriam 59, dos quais 24 estariam mortos. “Aprendam com os moradores de Beit Lahiya”, ele sugeriu, ameaçando novas operações das forças israelenses que vão requerer a evacuação de mais território. “Os planos estão prontos e aprovados”, ameaçou. No final, acusou a liderança “corrupta” e “assassina” de viver em segurança, com suas famílias, dentro de túneis ou hospedados em hotéis de luxo.
Os manifestantes gritavam ontem “Fora, Hamas”, diante do Hospital da Indonésia, e um e outro, por vezes, perguntava para cinegrafistas, como se fossem da rede catariana Al Jazeera, por que não cobriam os protestos, acusando-0s de fidelidade ao Hamas. Os manifestantes prometem estender as manifestações para os bairros com forte presença do Hamas, como a praça Saraya, o campo de refugiados de Jabaliya e a praça Bani Suheila, em Khan Yunis.


A liderança do Hamas acusou Israel de instigar os protestos – e o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu respondeu, em Jerusalém: “Os protestos são a prova de que nossa política está dando resultados”. O êxodo palestino, pretendido em larga escala pelo presidente Donald Trump, está acontecendo a conta-gotas, espontaneamente. Mesmo assim, há notícias, não confirmadas, de que enviados americanos e israelenses andam pelo Sudão e Somália em busca de espaço para abrigar o maior número possível de gazenses.
O palestino que quiser partir, e não estiver doente, nem ter dupla nacionalidade, deve fazer o pedido à polícia israelense. Há uma fila de milhares em exame. A pesquisa de antecedentes é rigorosa para impedir a fuga de combatentes do Hamas. As portas de saída são a Ponte Allemby e o posto de fronteira com a Jordânia, Kerem Shalom, ou o Aeroporto Ramon, perto de Eilat.

The End: Libertado cineasta palestino preso por Israel.

Ballal medicado. Foto do co-diretor israelense.

Novas cenas de “No Other Land” (Sem Chão), o documentário que ganhou o Oscar deste ano, protagonizadas por um de seus quatro diretores, o cineasta palestino Hamdan Ballal, preso ontem depois de espancado por colonos judeus na Cisjordânia ocupada, e libertado na manhã desta terça-feira pelo exército israelense.
Vítima de pedradas, a cabeça sangrando, ele foi acusado de ser o apedrejador que iniciou o tumulto na aldeia em que mora, Susya, em Hebron. As versões do que aconteceu se chocam, dependendo de quem as narra, se colonos ou palestinos. Ele próprio, Ballal, 37, contou que protegia sua casa, durante um ataque de colonos, quando caiu no chão golpeado na cabeça, e dois soldados lhe apontavam seus fuzis.
“Enquanto no chão, um homem continuou batendo em todo o meu corpo” – ele disse ao New York Times, que o entrevistou por telefone.
O estopim também tem duas versões. Um colono surgiu em Susya quando os palestinos encerravam o jejum diário do sagrado mês do Ramadã. Pediram-lhe que se retirasse. E aí surgiram cerca de 20 outros colonos, atirando pedras e quebrando janelas, furando pneus dos carros. Segundo a outra versão, colonos surgiram com ovelhas no pasto que não lhes pertencia, uma provocação, e foram repelidos.
Enquanto detido, os olhos vendados, Ballal conta que soldados punham objetos em sua cabeça, e diziam: “Este é o cineasta que ganhou o Oscar”.
As acusações de Ballal não foram comentadas pelo porta-voz militar em Jerusalém. Os soldados que o prenderam o acusaram de atirar pedras, destruir propriedade e ameaçar a segurança regional. As mesmas suspeitas recaíram contra outros três palestinos detidos com Ballal. Só um israelense, menor de idade, foi detido, e depois liberado. Os outros participantes fugiram com a chegada de um batalhão formado… por colonos.
Ativistas de direitos humanos, muitos norte-americanos, denunciam que o batalhão de colonos raramente reprime, ou prende, os atacantes israelenses. O New York Times desta terça-feira lembra que o presidente Trump retirou as sanções impostas pelo ex-presidente Biden contra colonos violentos.
Outro diretor de No Other Land, Basel Adra, estava em Susya. Ele conta que soldados israelenses e policiais nada fizeram para impedir o ataque dos colonos mascarados, mas procuraram dispersar os palestinos. O documentário premiado com o Oscar conta as mesmas cenas do confronto de segunda-feira, porém antigas. São uma sequela de Sem Chão – II.

Os quatro diretores de “No Other Land” na noite do Oscar

SEM CHÃO

Um dos diretores palestino do filme “No Other Land” (Sem Chão), vencedor do Oscar de Melhor Documentário de Longa Metragem deste ano, Hamdan Ballal, foi “linchado” por cerca de 20 colonos israelenses mascarados em Susya, perto de Hebron, na Cisjordânia Ocupada, às seis da tarde local (13h no Brasil) de segunda-feira.
A ambulância que levava Ballal para um hospital foi parada por soldados que o retiraram e o prenderam. Palestinos que testemunharam o tumulto disseram que o pelotão enviado à Susya era formado, principalmente, por jovens judeus de colônias da região de Hebron. Carregavam pedras e facas.
O ataque começou quando um colono surgiu à porta de uma escola em Susya. Quando os moradores pediram que ele se retirasse, surgiram uns 20 outros colonos atirando pedras, furando tanques de água, roubando câmeras de segurança e quebrando janelas de carros. Eles fugiram à chegada dos soldados. Era a hora em que os palestinos quebravam o jejum do mês sagrado do Ramadã.
O co-diretor israelense de No Other Land, Yuval Abraham, postou, na plataforma X, que Ballal, 37 anos, foi “linchado” e ferido na cabeça e no estômago. Ele não sabia dizer para onde o levaram. Tarde da noite, um porta-voz militar informou que ele estava detido para questionamento, com três outros palestinos. A advogada que os representa, Leah Zemel, disse que, antes, o trio recebeu tratamento médico, e, depois, seria levado para um centro militar. No confronto de pedradas, um israelense também foi ferido
O documentário vencedor do Oscar foi filmado durante cinco anos, entre 2019 e 2023, em Masafer Yatta, na Cisjordânia ocupada. O seu enredo inclui muitas situações de ataques de colonos a palestinos, e demolições de casas por tratores israelenses, sob a alegação de que foram levantadas em “Área C”, proibida tanto para construções palestinas ou judaicas, segundo os Acordos de Oslo. O documentário também retrata a relação de amizade entre um palestino e israelense.

O co-diretor Hamdan Ballal

Na noite da entrega do Oscar, antes de anunciado o prêmio para o documentário dos diretores Ballal, Yuval Abraham, Basel Adra e Rachel Szor, vários colonos vandalizaram a cidade do filme, Masafer Yatta. Desde a invasão do Hamas em 7 de outubro de 2023, que matou 1.200 pessoas e provocou uma guerra que se expandiu em múltiplos fronts, Israel aumentou a pressão na Cisjordânia, ocupada durante a Guerra dos Seis Dias, em 1967, e prendeu 40 mil palestinos.